Caso Araucária – Economia ou Política

Data da publicação: 16/01/2006

A disputa entre a térmica UEG Araucária e a estatal Copel (Companhia de Energia Elétrica do Paraná) revela a complexidade de empreendimentos firmados entre empreendedores privados e administrações públicas. Evidencia também os riscos de contratos de longo prazo diante da imprevisibilidade política do governo de plantão.

A termelétrica a gás natural tem como acionistas a El Paso (60%), a Copel (20%) e a Petrobras (20%). Foi construída numa conjuntura de crise de oferta de energia, onde novos projetos foram estimulados pelos governos para evitar a ameaça do apagão que poderia suceder ao  racionamento de energia de 2001.

A usina foi considerada apta a operar no segundo semestre de 2002, com testes de performance garantindo 484 MW de capacidade. Não foi posta em funcionamento desde então. Consumiu US$ 320 milhões em investimentos e emprega cerca de 100 pessoas.

O contrato entre a UEG Araucária e a própria Copel estabeleceu que esta última teria o compromisso de adquirir, por 20 anos, a capacidade total da termelétrica. Caberia ainda à Copel operar a térmica e garantir o suprimento de gás natural por um contrato com a Compagás.

Após a Copel ter pago três parcelas mensais, Roberto Requião foi eleito governador do estado do Paraná e suspendeu os pagamentos, tornando explícita a quebra de contrato.

A partir da quebra contratual, El Paso e Petrobras acionaram o processo judicial que hoje se concentra na corte de arbitragem da Câmara Internacional de Comércio de Paris. O uso de arbitragem, contestado pela Copel, foi legitimado em outubro de 2005 pelo Superior Tribunal de Justiça.

Por falta de pagamento da Copel, a Compagás cancelou o contrato com a Petrobras, fornecedora do gás. A companhia energética do Paraná reconhece em seu balanço um passivo de R$ 650 milhões relativo à dívida indireta com a Petrobras, mas o passivo resultante da quebra de contrato com a UEG Araucária ainda não aparece em seus livros contábeis. O contrato prevê multa por rescisão unilateral que pode ultrapassar US$ 500 milhões.

Buscando tirar o foco da quebra contratual e justificar a interrupção dos pagamentos, o governo passou a disseminar a tese de que a térmica teria problemas técnicos e de segurança. Opiniões ou laudos sobre as condições atuais de operação são irrelevantes: especialistas consultados afirmam que após dois anos sem operar qualquer usina requer recomissionamento (série de testes de desempenho técnico).

As conseqüências negativas sobre o futuro da própria Copel, as perdas para a Petrobras, o desrespeito aos acionistas minoritários e o sinal nocivo para futuros investimentos não são facilmente comunicáveis ao cidadão comum, especialmente quando há, do outro lado, a máquina estatal dizendo o contrário.

É um contra-senso, diante da necessidade de expansão de geração de energia no Brasil, existir no Paraná uma usina inoperante, pronta há três anos, e apta a atender a 16% do crescimento anual de consumo brasileiro. Usina considerada “estado da arte” na tecnologia empregada, após o necessário recomissionamento estaria apta a operar no prazo de quatro meses.

No modelo de Parcerias Público-Privadas, governos se propõem a atrair parceiros privados para projetos de longo prazo. Imaginem se todos os contratos de parcerias forem contestados “pelo bem do povo” em cada eleição onde há alternância de poder! A solução do caso UEG Araucária sinalizaria respeito a contratos e aumentaria as chances de sucesso das PPPs.

O atraso na obtenção de uma solução é ruim para todos: Copel, El Paso, Petrobras, população paranaense e consumidores de energia elétrica.

 

Claudio Sales é presidente da Câmara Brasileira de Investidores em Energia Elétrica (CBIEE)

 

Todos os direitos reservados ao Instituto Acende Brasil