Como matar uma oportunidade de negócio
O Projeto de Lei (PL) 4.211/2021, em tramitação no Congresso Nacional, pode ter um impacto negativo na economia brasileira e na luta contra as mudanças climáticas. Ao contrário do que seria a intenção do legislador, o projeto, que prevê a obrigatoriedade do reflorestamento de margens de reservatórios na Amazônia, traz prejuízos não apenas para o meio ambiente, mas também para a economia brasileira.
Graças à sua extensa área florestal, o Brasil é um dos países com maior potencial de captura de carbono do mundo, o que o torna um importante player no mercado de créditos de carbono. A venda desses créditos é uma atividade cada vez mais valorizada e pode gerar receitas significativas para o País.
A legislação atual não prevê o plantio nas margens dos reservatórios, e sim a manutenção da Área de Preservação Permanente (APP) sem nenhum tipo de ocupação. Poucos perceberam que, se for aprovada a obrigatoriedade do reflorestamento das margens de reservatórios como previsto no PL 4.211/2021, ela acabará com a chamada “adicionalidade” da captura de carbono de florestas que poderão ser plantadas nas margens dos reservatórios porque a prática passará a ser uma obrigação legal, e não mais uma alternativa adicional para preservação. Dessa forma, por não haver a adicionalidade, não seria mais possível vender créditos de carbono provenientes dessas áreas.
A situação é ainda mais preocupante se levarmos em consideração o cenário global. O Acordo de Paris, assinado em 2015, tem como objetivo limitar o aquecimento global a 2 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais, e para cumprir essa meta é preciso reduzir as emissões de gases de efeito estufa, incluindo o dióxido de carbono. A venda de créditos de carbono é uma das ferramentas mais eficazes para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, já que incentiva a adoção de práticas mais sustentáveis.
Para ter uma ideia do potencial econômico (custos e receitas) da captura de carbono do reflorestamento das margens dos reservatórios das hidrelétricas na Região Norte, fizemos uma estimativa conservadora considerando o reflorestamento de 10% da área do reservatório da Usina Hidrelétrica (UHE) de Tucuruí.
Do lado dos custos, assumindo que a área passível de reflorestamento na UHE de Tucuruí é de 21 mil hectares e que o reflorestamento com espécies nativas na Amazônia custa cerca de US$ 2 mil por hectare, os custos iniciais – desprezando-se custos operacionais para manter a floresta – seriam de US$ 42 milhões.
Do lado das receitas, como uma floresta plantada com espécies nativas na Amazônia captura, em média, 12 toneladas de CO2 por hectare por ano, o potencial de geração de créditos de carbono nas margens do reservatório de Tucuruí seria de 252 mil toneladas de CO2 equivalente (tCO2e). Portanto, adotando o valor de US$ 5,80 por tonelada de carbono vendida no mercado voluntário de 2021, a receita seria de cerca de US$ 1,5 milhão por ano.
Isso implica que, mesmo mantida a situação atual (sem obrigatoriedade do plantio, conforme pretende o PL 4.211), os custos iniciais somente seriam pagos em 28 anos. E, se o PL 4.211 for aprovado, perde-se a possibilidade de obtenção de receitas de US$ 1,5 milhão por ano (ou US$ 42 milhões em 28 anos) pela venda de créditos de carbono.
Em resumo, uma iniciativa que já é pouco viável economicamente seria ainda pior se o PL 4.211 for aprovado, impondo aumento de custos aos reservatórios hidrelétricos e um aumento das tarifas de eletricidade para os consumidores.
Dessa forma, é fundamental que o Congresso Nacional considere não apenas os aspectos ambientais, mas também os econômicos, ao avaliar o PL 4.211/2021.
Uma alternativa a esse projeto de lei seria incentivar o reflorestamento das margens de reservatórios, reconhecendo sua adicionalidade e concedendo créditos de carbono para áreas que passaram por processos de restauração.
Essa medida pode estimular o setor privado a investir em reflorestamento e, ao mesmo tempo, contribuir para a redução das emissões de gases de efeito estufa. Além disso, a inclusão de incentivos pode estimular a criação de mais oportunidades de negócios e gerar empregos e renda em setores relacionados ao reflorestamento e à produção de créditos de carbono.
É importante ressaltar que o PL 4.211/2021 é apenas um exemplo do que o Brasil enfrenta no campo da sustentabilidade, pois envolve o desafio de equilibrar as obrigações legais, as oportunidades de negócio e a preservação ambiental.
A captura de carbono é uma atividade cada vez mais importante e valiosa em todo o mundo e o Brasil pode desempenhar um papel fundamental nesse cenário.
Portanto, é preciso reconhecer que, apesar de sua boa intenção ambiental original, o PL 4.211/2021 não levou em conta que seus comandos acabam com uma bela oportunidade de negócio – também de natureza ambiental – que poderia gerar mais renda e mais empregos de qualidade no Brasil.