Jabutis do Congresso e aumentos na conta de luz
Estamos diante de mais uma ameaça de aumento significativo da tarifa de eletricidade caso o Presidente da República não vete artigos prevendo subsídios ou reservas de mercado para várias fontes de geração de eletricidade.
O Projeto de Lei 576/2021, que deveria tratar do aproveitamento de potencial de geração de energia eólica offshore, foi vergonhosamente piorado na sua tramitação com a inserção de subsídios e reservas de mercado que beneficiam poucos às custas dos consumidores de eletricidade.
O texto original já era problemático, pois continha um defeito de origem em seu artigo 20 ao propor uma reserva de mercado (sinônimo de energia mais cara para o consumidor) para a contratação de energia eólica offshore. Ou seja, previa leilões exclusivos para a contratação de geração offshore sem competir com as demais fontes.
Como se não bastasse, foram inseridas emendas “jabutis” – completamente alheias à temática do projeto de lei original – que nada mais fazem que acolher interesses específicos de grupos de pressão.
São emendas que obrigam a contratação de certos tipos de usinas de geração elétrica, desconsiderando as autoridades responsáveis pelo planejamento setorial – o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) – e o processo concorrencial que visa à modicidade tarifária.
De forma sintética, os principais “jabutis” constam do artigo 21 e provocam as seguintes distorções:
(i) prorrogação dos contratos de geração a partir de carvão mineral até 2050, na contramão dos esforços globais para descarbonização das matrizes elétricas;
(ii) substituição ou criação de reservas de mercado adicionais para pequenas centrais hidrelétricas, usinas eólicas e energia proveniente de hidrogênio líquido, desconsiderando o custo-benefício destas fontes e suas implicações na operação do sistema elétrico; e
(iii) alteração do preço-teto para leilões de contratação de termelétricas a gás que haviam sido especificadas na Lei de Desestatização da Eletrobras (Lei 14.182/2021), com acionamento obrigatório por 70% do tempo, e considerando apenas o valor da molécula de combustível (desconsiderando o custo dos gasodutos de transporte), o que tem o efeito de elevar o preço total para o consumidor.
O Congresso precisa interromper a prática destes “jabutis” que quebram o planejamento do setor elétrico e resultam em ineficiências, sobreoferta de energia e sobrecustos para os consumidores.
O parlamento já demonstrou que não resiste ao canto das sereias lobistas. Agora nos resta a esperança de o Presidente Lula chamar para si a responsabilidade de vetar os jabutis acima e evitar novos aumentos da conta de luz e da inflação.
Claudio Sales, Eduardo Müller Monteiro e Richard Hochstetler são do Instituto Acende Brasil (www.acendebrasil.com.br)