Tarifa branca, que dá desconto na conta de luz, ‘não pegou’
06/jul/2021, O Globo
Criada para reduzir o consumo de energia, a chamada tarifa branca — em vigor desde janeiro de 2018 — não pegou. Com ela, é possível obter desconto na conta de luz fora do horário de pico, uma iniciativa que o atual governo quer expandir, para evitar o risco de racionamento. Nos períodos de maior demanda, porém, a energia tem sobretaxa. A ideia é aliviar o sistema em momentos de forte uso.
Apesar das vantagens, o número de consumidores que aderiram ao programa até hoje representa menos de 0,1% do total (mais precisamente, só 0,06% dos 87 milhões no país), de acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
A adesão, que é voluntária, chegou a crescer 52% entre o início de 2020 e março deste ano, passando de 37,8 mil para 57,6 mil clientes residenciais e de baixa tensão. Mas está longe do potencial.
Para analistas, a baixa divulgação por parte das concessionárias de energia explica por que o programa não deslanchou. Eles defendem a criação de relatórios de consumo para que os clientes possam identificar os períodos do dia em que consomem mais energia.
—É preciso que o consumidor, sozinho, faça suas contas e analise o perfil de consumo. A regulação é feita de uma forma que a distribuidora faz suas projeções de mercado e de receita e, se programas como esse forem bem-sucedidos, a receita pode ser menor que a projetada. Então, falta estímulo para que as próprias concessionárias incentivem (a tarifa branca) —explica Lavinia Hollanda, diretora executiva da Escopo Energia.
A tarifa branca vale apenas para os dias úteis e prevê três preços, cujos valores e os horários variam por concessionária. No caso da Light, que atua no Rio, ela vale entre 22h30 e 17h e custa R$ 0,612 por quilowatt-hora (kWh).
EMPRESAS SÃO MAIORIA
É uma redução de 11,81% em relação à tarifa convencional, de R$ 0,694 por kWh. No caso do horário de pico (entre 17h30 e 20h30), o valor dobra, para R$ 1,268 por kWh. Além disso, há o horário intermediário, de20h30às22h 30, de R$ 0,854 por kWh.
A empresária Márcia Arriete aderiu ao programa para reduzir a conta de luz de sua loja de decoração em um shopping na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio.
Primeiro, trocou as lâmpadas e o ar-condicionado. Depois, instalou tela especial que protege as janelas do calor do sol. Mas, ainda assim, achou pouco diante da maior seca dos últimos 91 anos e dos reajustes nas bandeiras tarifárias.
Em uma pesquisa na internet, descobriu a tarifa branca e foi atraída pela projeção de redução na conta em até 20%
—Pedi para aderira o programa. É uma tentativa de reduzir a conta de luz e ter um consumo mais eficiente e responsável. Precisamos mudar nossos hábitos e comportamentos para a nossa geração e as futuras — diz Márcia, que comanda a Soho Design, na Barra, coma sócia Adriana Lo Bianco.
Ela brinca que criou o seu próprio planejamento energético. Desliga um dos aparelhos de ar-condicionado no fim da tarde e, como atende apenas com hora agendada, o último cliente é marcado até as 17h.
Especialistas defendem mudanças, com a criação de mais faixas de horários, permitindo uso mais consciente de energia, além de sistema de bonificação para o consumidor que reduzir o volume de consumo.
Alexei Vivan, presidente da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica (ABCE), defende maior divulgação, sobretudo para empresas de pequeno porte, que não têm demanda suficiente para comprar energia no mercado livre.
Na tarifa branca, as empresas somam 57,9% dos megawatt consumidos por mês (MWh/mês), seguidos por residencial, com 40,1% e rural.
O Ministério de Minas e Energia vêm se reunindo com a indústria desde o mês passado para criar um incentivo à redução do consumo nos momentos de pico da demanda pelos grandes consumidores, nos moldes da tarifa branca.
— O investimento todo do setor é justamente para atender( a demanda) nos momentos de pico. Hoje, o risco é não ter energia suficiente por conta do baixo nível de água nos reservatórios —diz Alexei.
Para os especialistas, as concessionárias deveriam criar relatórios de consumo para clientes residenciais e de pequeno porte. Dessa forma, seria possível mensurar o período diário de maior consumo.
—O consumidor precisa saber que, dependendo da hora, a energia é mais cara. A tarifa branca tem conceito interessante, mas não é sustentável, pois a distribuidora repassa o cus toda redução de receita durante a revisão tarifária, onerando os demais—afirma Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil.
O consumidor que quiser aderir deve fazer uma solicitação à distribuidora, que terá um mês para instalar um novo medidor de energia. Se verificar que não é vantajoso, poderá pedir o retorno à o que levará 30 dias.
— É preciso modernizar o setor, permitindo que o consumidor pequeno possa entrar no mercado livre, escolher seu fornecedor de energia — explica Clauber Leite, coordenador do Programa de Energia do Idec.
Na área de concessão da Enel, são 1.942 clientes. Lá, a tarifa branca vale das 22h às 16h. Nesse intervalo, o kWh é de R $0,571, menor que o R$ 0,714 da convencional. No horário da ponta, sai a R $1,333. Já o horário intermediário tem valor de R$ 0,880 entre 16h e 18h e, depois, das 21h às 22h.
—É uma oportunidade para parte de nossos clientes. A tarifa branca exige postura mais ativa e vigilante do consumidor —diz a diretora de Mercado da Enel Distribuição Rio, Ana Teresa Raposo.