Ações do governo sobre Eletrobras destroem valor da companhia, dizem especialistas
As ações e falas do governo de Luiz Inácio Lula da Silva contrárias à privatização da Eletrobras vêm criando ruído e destruindo valor das ações da companhia, que já acumulam queda de 20% desde o início do ano, em um momento em que a nova administração da elétrica persegue uma virada dos negócios e maior eficiência, apontam especialistas do setor elétrico.
Mesmo que vejam o processo de privatização conduzido pelo governo passado como praticamente blindado das investidas atuais e não acreditem no sucesso de ações como a da Advocacia-Geral da União (AGU), eles apontam que a postura do governo no caso da Eletrobras representa um “tiro no pé” e joga contra seus próprios planos de atrair mais investimentos em energia no Brasil.
Lula tem sido bastante vocal contra a privatização da Eletrobras e desde que assumiu o governo em janeiro tem dito que tentaria reverter o processo. A AGU entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para elevar o poder de decisão da União na companhia, e em seguida Lula disse que ainda poderia apresentar novos questionamentos.
Desde o início do ano, as ações ordinárias da Eletrobras caíram 20,23%, a 33,38 reais, conforme o fechamento da véspera. O desempenho dos papéis da elétrica se mostra pior que o Ibovespa, que retraiu 3,36% no mesmo período, e contrasta com o do Índice de Energia Elétrica (IEE), composto pelos ativos mais negociados e mais representativos do setor, que subiu 4,02%.
Para a advogada e economista Elena Landau, o governo “forçou a barra e inventou” a tese de que a União deveria ter poder de voto proporcional à sua participação na Eletrobras, mesmo sabendo que a ação não teria condições de vingar no STF.
“Na minha avaliação é uma ação para agradar o cercadinho do Lula, acho que não vai dar em nada a não ser gerar enormes prejuízos para os acionistas da Eletrobras, em especial ao governo que vai perder dinheiro de patrimônio”, afirmou Landau.
Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, afirma que o governo vem se beneficiando com a privatização da Eletrobras à medida que o processo previu recursos bilionários para modicidade tarifária e fundos regionais.
Ele também apontou que o processo de capitalização ampliou a capacidade de investimentos da Eletrobras, que vinha perdendo competitividade ante outras companhias do setor elétrico, tendo inclusive seu valor de mercado chegado a representar apenas 18% de valor patrimonial entre 2012 e 2015.
“O governo é o maior acionista (da Eletrobras), ele devia… criar um ambiente para que não apenas a empresa, mas outras do setor pudessem valer mais, ao mesmo tempo em que fortalece a competição para que o consumidor possa ter energia ao menor custo possível.”
O CEO da Eletrobras, Wilson Ferreira Júnior, avaliou na semana passada que a desvalorização das ações da companhia neste ano reflete, em parte, a postura desfavorável do governo sobre a privatização.
“Sob o ponto de vista do desempenho, que é o que eu posso responder… Tem crescimento de receita e de Ebitda, teve redução de lucro quase que exclusivamente por compromissos da própria privatização ao governo, ou por eventos não correntes.. Então a perspectiva para a companhia, sob o ponto de vista operacional, é muito boa”, disse, durante coletiva de imprensa.
Uma mudança do “status quo” da privatização, ainda que vista como remota, tem preocupado analistas, que alertam para riscos de que a insegurança jurídica afugente investimentos no país.
“A economia de nenhum país se beneficia de uma quebra de contrato. Que tipo de insegurança isso criaria para todos os outros investimentos”, escreveu Antonio Junqueira, head de Research do Citi para a América Latina, em análise a clientes.
Embora tenha aproximadamente 43% das ações ordinárias da Eletrobras, pelas regras da privatização a União ficou sujeita à proibição de que acionista ou grupo de acionistas exerçam votos em número superior a 10% –regra incluída para evitar movimentos de assunção do controle da empresa, que hoje tem capital pulverizado.
A remoção do limite de 10% dos votos, como quer o governo na ação no STF, daria à União maior poder para dar as cartas na Eletrobras, segundo analistas.
(Por Letícia Fucuchima e Rodrigo Viga Gaier; com reportagem adicional de Paula Arend Laier)