Artigo: COP-26: menos conversa e mais decisões
06/out/2021, O Estado de S. Paulo
06/out/2021, O Estado de S. Paulo
Em abril deste ano o presidente americano, Joe Biden, reuniu 40 líderes mundiais na Cúpula do Clima para discutir medidas de redução de gases de efeito estufa (GEEs) que a crise climática exige. Na ocasião, Biden anunciou que as emissões americanas serão reduzidas pela metade até 2030 a partir dos valores de 2005. Seguindo os anúncios de compromissos climáticos feitos por outros países, além de se comprometer a eliminar o desmatamento ilegal até 2030, o Brasil declarou que antecipará para 2050 a meta de neutralizar as emissões até 2060. O compromisso de neutralizar as emissões já havia sido feito em dezembro de 2020, quando o Brasil revisou suas metas, conhecidas como NDCs (Nationally Determined Contributions).
Uma das revisões foi a eliminação dos Planos Setoriais, o que foi um acerto, por serem muito genéricos e sem metas objetivas. Apenas para citar um exemplo, a meta para o setor agropecuário – que é o segundo setor que mais emite GEEs no Brasil, atrás apenas dos desmatamentos – era “fortalecer o Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC)”.
Outra revisão foi a alteração do valor da linha de base de emissões totais em 2005 com a manutenção dos compromissos de redução, decisão que foi interpretada como manobra para diminuir a meta brasileira de forma indireta. As emissões totais declaradas na COP em Paris – e que definiram o compromisso brasileiro – eram da ordem de 2,1 bilhões de toneladas de gás carbônico equivalente (tCO2e) e passaram para 2,8 bilhões de tCO2e, um aumento de 33%, mas foram mantidos os compromissos de redução anteriores: 37% e 43% até 2025 e 2030, respectivamente. A fim de manter a meta inicial, as reduções precisariam ser de 53% e 57%, respectivamente.
Embora os países tenham manifestado compromissos para reduzir suas emissões, elas serão insuficientes para impedir o aumento da temperatura global. Um estudo da ONU (Emissions Gap Report 2020) concluiu que o mundo caminha para um aumento de temperatura superior a 3°C neste século. Este patamar vai muito além das metas do Acordo de Paris, que busca manter o aumento do aquecimento global em 1,5°C. Especialistas apontam que o mundo precisa de metas mais ambiciosas.
No setor de energia, a Agência Internacional de Energia divulgou estudo com ações que devem ser adotadas para alcançar a neutralidade nas emissões em 2050. O estudo apresenta dezenas de ações necessárias, suas consequências e revela a dificuldade que será reduzir as emissões de GEEs no setor de energia global. A conclusão para o setor de energia repete a conclusão global: o mundo está atrasado.
Olhando para o Brasil, o caminho da neutralidade requer a definição de um roteiro com urgência. Quais ações serão necessárias? Quando elas devem começar? Quais os investimentos necessários? Quais setores econômicos podem dar maiores contribuições?
Não encontramos nenhuma proposta que será apresentada e discutida na COP-26, em Glasgow, de 31 de outubro a 12 de novembro, para regulamentar o artigo 6 do Acordo de Paris, que prevê o estabelecimento de um mercado de carbono global. A mesma falta de informações e de interlocutores se repete quando buscamos as propostas que o Brasil pretende levar para Glasgow.
As COPs precisam ter menos conversas e mais decisões. As intermináveis buscas por consensos só atrasam as medidas práticas de redução de emissões. É frustrante e preocupante a ausência de lideranças para reunir os países que mais emitem GEEs (os 10 maiores emissores são responsáveis por 64% das emissões globais) e estabelecer critérios objetivos de redução de emissões.
Um sinal claro para acelerar a redução das emissões de GEEs seria a mudança do formato dessas conferências, pouco conclusivas e custosas, passando a promover reuniões multilaterais focadas nos maiores emissores, com metas claras e ações definidas por país, inclusive com mecanismos de cooperação e de financiamento climático.
Qual país dará o primeiro passo?
Claudio J. D. Sales, Alexandre Uhlig e Eduardo Müller Monteiro são, respectivamente, Presidente, Diretor de Assuntos Socioambientais e Sustentabilidade e Diretor Executivo do Instituto Acende Brasil.