Emendas na MP do Minha Casa podem custar R$ 1 bi por ano na conta de luz, diz Aneel
Agência afirmou em ofício ao MME que os trechos estranhos ao projeto inicial enviado pelo governo impactarão na conta dos consumidores que não têm painel solar e continuam comprando energia das distribuidoras
A aprovação no Congresso de emendas na Medida Provisória (MP) do programa Minha Casa, Minha Vida, que tratava da inclusão de painéis solares, terá um potencial de impacto anual de R$ 1 bilhão na conta de luz dos demais consumidores de energia via aumentos nas tarifas, segundo cálculos da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
A proposta impõe a compra compulsória dos excedentes de energia elétrica gerada nas residências populares pelas distribuidoras e a dispensa de licitação para os órgãos públicos para aquisição de excedente de energia dos programas habitacionais.
De acordo com ofício enviado pela da agência reguladora ao Ministério de Minas e Energia (MME), os chamados os “jabutis” — trechos estranhos ao projeto inicial enviado pelo governo — impactarão diretamente na conta dos demais consumidores que não têm painel solar e continuam comprando energia das distribuidoras, o mercado regulado.
“Destaca-se que as medidas previstas no art. 38, que conferem redução mínima de 50% no custo de disponibilidade dos consumidores inscritos no Cadastro Único, associada à possibilidade de comercialização do excedente de energia, com compra compulsória pelas distribuidoras, têm um potencial de impacto anual da ordem de R$ 1 bilhão, a ser suportado pelos demais consumidores via aumentos tarifários”, diz o documento ao qual o Valor teve acesso.
O Marco Legal da geração distribuída (Lei 14300/2022) prevê que a produção de energia é para consumo próprio. Pelas regras do setor, caso o consumidor gere mais energia, ele pode injetar na rede em forma de créditos de energia válidos durante 60 meses para compensar um consumo maior que possa vir a ter futuramente.
Segundo a Aneel, as concessionárias estão com sobra de energia e o excedente deve ser revendido a preço de mercado (Preço de Liquidação de Diferenças – PLD, no jargão do setor), hoje de R$ 69 por megawatt-hora (MWh). O texto determina que as empresas deverão adquirir a energia e determina um valor fixo muito superior aos do PLD. Este prejuízo será repassado aos consumidores mensalmente com atualização da Selic.
“O preço médio de compra de energia pelas distribuidoras é de R$ R$ 227,34/MWh. No entanto, no contexto atual de sobrecontratação das distribuidoras, qualquer compra adicional de energia, de forma compulsória, será revendida ao Preço de Liquidação de Diferenças (PLD), que está em seu valor mínimo (R$ 69,04/MWh), diante da condição hidrológica. Ou seja, o comando obrigaria os consumidores cativos das distribuidoras, incluindo os consumidores atendidos pela Tarifa Social, a adquirir energia por R$ 601,51/MWh para vender a R$ 69,04/MWh, imputando um custo adicional de R$ 531 para cada MWh adquirido (770% do PLD)”, diz a Aneel.
Para associações ligadas aos consumidores e especialistas, os dispositivos desvirtuam o Marco Legal, implode o modelo de compensação, cria uma reserva de mercado e abre precedentes para falta de transparência. Por conta disso, pedem o veto presidencial.
O presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Luiz Eduardo Barata, trata o caso com indignação, já que vai na contramão do discurso dos parlamentares em baixar a tarifa dos consumidores.
“Praticamente toda semana o Congresso Nacional muda algo no setor elétrico que aumenta a conta para o consumidor. O caso da geração distribuída é o mais extremo. A conta está ficando impagável e o setor elétrico se aproxima do colapso. Os consumidores esperam que o presidente vete as emendas que trazem mais 1 bilhão para o consumidor pagar.”
A proposta está em fase de sanção presidencial. O presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, avalia que as emendas causam malefícios ao consumidor médio que não precisava existir. Segundo Sales, isso foi feito sem discussão de impacto regulatório e tarifário e sugere que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vete os artigos.
Procurado, o ministério não quis se manifestar.