Energia é cara por causa dos subsídios
Os subsídios são um dos vilões do custo alto da energia para o consumidor
Nos últimos anos, o Brasil aumentou a sua capacidade de produzir energia, incluindo sistemas de geração que ficaram mais baratos, como os novos parques eólicos e de energia solar. Geralmente, quando a oferta aumenta o preço baixa, mas o sistema elétrico brasileiro contraria esta lógica. Por que a conta de luz é tão cara no Brasil ? Há várias respostas.
O maior vilão da conta de luz é formado por impostos, encargos setoriais e subsídios pagos por todos os brasileiros, segundo os dois especialistas consultados nesta reportagem. Encargos setoriais estão embutidos na conta de luz, são arrecadados pelas distribuidoras e repassados ao governo federal para bancar subsídios e políticas públicas, como a tarifa social, entre outras.
Somente um encargo chamado Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) terá este ano um orçamento de R$ 37 bilhões e será dividido por todos os brasileiros que pagam uma conta de luz. “Num ambiente saudável e transparente, as diversas fontes deveriam resultar num preço módico da energia”, comenta o presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, que aponta a CDE como o principal vilão da conta de energia.
No ano passado, os brasileiros pagaram R$ 40,3 bilhões de subsídios na conta de energia, segundo o subsidiômetro da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Os subsídios aparecem nas contas de luz dentro dos encargos setoriais e, como o nome diz, subsidiam às fontes renováveis, a geração distribuída – aquela geração que ocorre próxima ao consumo, como a que se dá em cima dos telhados – e até algumas fontes, que não fazem mais sentido nesta era de transição energética, como o carvão, por ser muito poluente.
“Tem que se discutir a CDE. É um fundo que envolve políticas públicas e deveria ser revisto. Tem vários subsídios que poderiam ser revistos. Tá na hora de começar a passar um pente fino, diminuir estes encargos e não perpetuar os subsídios”, aponta o diretor técnico da PSR, Rodrigo Gelli. Os subsídios corresponderam a 13,21% da conta de luz dos brasileiros em 2023, segundo informações da Aneel.
O setor elétrico é todo regulado pela Aneel. Tudo que é cobrado nas contas é aprovado em leis que passam pelo Congresso Nacional. “Há muito lobby”, resume Rodrigo Gelli, acrescentando que “muitos dos custos que são cobrados na conta de luz foram colocados lá por deputados para privilegiar uma determinada fonte” ou setor. Então, também cabe ao cidadão acompanhar como estão votando aqueles que ele colocou no Copngresso Nacional. “A Aneel é quem menos tem culpa neste processo”, comenta Gelli.
Outros fatores que resultam numa energia cara
Os subsídios podem ser o grande vilão, mas existem outros fatores que encarecem a conta de luz como impostos cobrados pela União e Estados, além de taxas, como a da iluminação pública. Eles correspondem a cerca de metade do preço de uma conta de luz. A energia residencial no Brasil também está ficando cara e com menos consumidores para bancar custos que só são cobrados aos consumidores cativos, aqueles que não podem escolher a quem vão comprar energia. Entre os consumidores residenciais, só não está neste grupo quem produz sua própria energia.
Segundo um levantamento feito pela Associação Brasileira que representa os grandes consumidores (Abrace), a energia residencial do Brasil, em 2022, era mais cara do que nos 34 países que fazem parte da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que tem como membros Reino Unido, Estados Unidos e França, segundo um levantamento feito pela Abrace em 2022.
E aí entram pelo menos três fatores que estão deixando a conta mais cara para o consumidor residencial. “As termicas estão todas com o consumidor cativo. Os consumidores do mercado livre não contratam térmicas”, comenta Rodrigo Gelli. As térmicas vendem a energia mais cara do País, mas foram contratadas, a longo prazo, pelas distribuidoras de energia que tendem a ficar somente com os clientes residenciais. E, ainda em 2022, o Congresso Nacional aprovou a implantação de mais térmicas dentro da Lei de Privatização da Eletrobras que podem deixar isso ainda mais caro para o consumidor residencial.
E aí cabe mais uma explicação: as térmicas antigas foram construídas para dar segurança ao sistema de geração do País, que dependia das águas dos reservatórios das hidrelétricas. As termelétricas usam óleo combustível ou gás natural para produzir energia e este é um dos motivos pelos quais a energia que elas produzem é mais cara. A energia das térmicas foram contratadas, a longo prazo, pelas distribuidoras que vendem a energia para os consumidores cativos.
Muitos dos novos parques eólicos e solares que entraram em operação – e tem o preço da energia mais barata – vendem diretamente para os consumidores livres – que recebem a energia em alta tensão e podem escolher a empresa a quem vão comprar energia. Os consumidores livres têm, em média, uma conta de luz 30% menor do que a conta dos consumidores cativos.
Além da conta das térmicas, o consumidor residencial também tem a energia mais cara, porque as distribuidoras fizeram contratos de longo prazo de compra de energia, que não sofrem a influência do preço da energia no mercado de curto prazo, que está mais barata atualmente. “As distribuidoras não têm muita gestão destes contratos de longo prazo que incluíram cotas (da implantação) de Itaipu, Proinfra – um programa de incentivo às energias limpas – e das térmicas”, resume Gelli.
E não para por aí. Desde janeiro de 2024, os consumidores de energia em alta tensão podem migrar para o mercado livre. Ou seja, escolher a quem vão comprar energia. A quantidade de consumidores do mercado livre vem aumentando consideravelmente desde o ano passado e a tendência é crescer mais.
“Quando se acelera a migração para o mercado livre, o custo das distribuidoras vai continuar o mesmo, mas será dividido por menos gente. Isso significa que a tarifa vai aumentar”, resume Claudio Sales. Para chegar a tarifa, são contabilizados todos os custos das distribuidoras e dividido por todos os clientes. Com menos clientes, vai pagar mais quem continuar com as distribuidoras neste primeiro momento.
Na semana passada, até o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, em entrevista ao estúdio da epbr, no evento Cera Week 2024, classificou como “injusta” a abertura para o mercado livre no Brasil. Segundo ele, o consumidor do mercado livre – que inclui grandes empresas – compra energia entre R$ 220 e R$ 280 por megawatt (MW), enquanto o consumidor do mercado cativo – que é regulado e inclui os consumidores residenciais – paga cerca de R$ 600 por MW. Ele também já afirmou que o governo federal tem uma “preocupação” com a quantidade de subsídios cobrada na conta de energia.
A conta de energia não baixa, nem vai baixar para grande parte da população brasileira, apesar de já ter muitos consumidores pagando muito menos pela mesma energia de todo dia.