Lula admite impasse com Paraguai sobre Itaipu
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta segunda-feira (15) que tem divergências com o Paraguai sobre a tarifa de Itaipu e defendeu a revisão do acordo com o país vizinho sobre a gestão da empresa binacional.
O mandatário teve uma reunião com o presidente paraguaio, Santiago Peña, no Palácio do Itamaraty e, após o encontro, os dois presidentes deram uma declaração conjunta.
O petista disse que quer finalizar a renovação do contrato o mais rápido possível e afirmou que irá ao Paraguai para seguir as negociações.
“Eu disse ao companheiro que vamos rediscutir a questão das tarifas da Itaipu. Nós temos divergência na tarifa, mas estamos dispostos a encontrar solução conjuntamente e nos próximos dias vamos voltar a fazer reunião”, afirmou.
Itaipu foi construída na virada da década de 1970 para 1980. Na época, os dois países firmaram um contrato de 50 anos. Agora, está em discussão a renovação do chamado Anexo C do acordo, que trata das balizas financeiras da parceria entre os dois países.
Lula afirmou que é necessário fazer uma “discussão profunda” sobre esse trecho do tratado entre os países.
“Eu tenho muito interesse que isso seja feito o mais rápido possível e que a gente possa trabalhar para apresentar uma solução definitiva de novas relações entre Paraguai e Brasil na gestão da nossa importante Itaipu”, disse.
O mandatário também afirmou que “o Brasil tem a obrigação de contribuir para que o Paraguai possa utilizar todo o potencial de Itaipu para o crescimento do Paraguai”.
Peña, por sua vez, elogiou Lula e mencionou a importância de manter uma boa relação com o Brasil.
“Foi uma conversa sincera, aberta, com ambição construtiva. Comecei meu mandato em agosto do ano passado e desde o começo deixei muito claro: o Brasil é o maior parceiro do Paraguai e reconheço a liderança do Brasil como país e a liderança do presidente Lula. Não deixei margem para dúvida”, afirmou.
O presidente paraguaio disse que “escutou a posição do Brasil” e que o país “tem muito a contribuir nesse processo”.
“A visão do acordo foi construção, operação e pagamento da dívida de Itaipu —e os objetivos foram feitos. Foi construído, foi operado e a dívida foi paga. Tem muita gente que estudou os ganhos, as quedas, mas a hidrelétrica está lá e, hoje, é uma das maiores hidrelétricas do mundo”, afirmou.
Esta é mais uma etapa da divergência entre os países a respeito da tarifa da usina de Itaipu. Na semana passada, o Paraguai travou o orçamento da empresa, como forma de pressionar o Brasil a aumentar a tarifa.
O lado brasileiro vai em outra direção. A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), por sugestão da parte brasileira de Itaipu, aprovou, em dezembro de 2023, em caráter provisório, a manutenção do valor do Cuse em US$ 16 por kW para este ano.
Negociadores brasileiros dizem acreditar que o Paraguai não vai conseguir segurar o orçamento e travar os pagamentos por muito tempo, e terá de ceder.
A consequência do congelamento do orçamento é que empregados e prestadores de serviço da hidrelétrica ficaram com pagamentos atrasados no início de janeiro, como mostrou a Folha.
Pelo tratado firmado entre os dois países, a tarifa de Itaipu não é negociada. O valor deve corresponder ao necessário para cobrir as despesas do chamado Cuse (Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade).
A partir da gestão do almirante Anatalicio Risden Junior, no governo de Jair Bolsonaro (PL), o discurso oficial passou a ventilar a ideia de que a tarifa de Itaipu seria fruto de negociação entre os dois países. Essa versão foi reforçada pela atual gestão de Enio Verri, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O novo presidente do Paraguai, Santiago Peña, do Partido Colorado, criou um impasse político a partir dessa narrativa.
Ele insiste em elevar o Cuse para não parecer mais fraco que seu antecessor, que conseguiu aumentar a tarifa de Itaipu na negociação com o governo Lula em 2023.
O Tratado de Itaipu determina que 100% da energia precisa ser contratada, com eventuais sobras de cada lado sendo cedidas para o parceiro, mediante um pagamento.
Não há no documento imposições sobre como cada país vai tratar a sua parte da cota, reforçam os especialistas.
Do lado brasileiro, uma lei de 1973 obriga que a tarifa da hidrelétrica seja embutida na conta de luz de 31 distribuidoras de dez estados nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, seja qual for o preço.
Essa compra compulsória foi uma das estratégias em favor do financiamento e reforçou as garantias aos credores de que haveria fonte certa de recursos para pagar a dívida da obra.
O empréstimo foi feito integralmente pelo Brasil, bem como a apresentação das garantias e, segundo estudo do Instituto Acende Brasil, detalhado neste domingo pela Folha, a quitação também.
Os brasileiros consumiram a maior parte da energia e pagaram integralmente, via conta de luz, os US$ 63 bilhões (R$ 311,7 bilhões) da dívida, até a última parcela, em fevereiro deste ano.