Cemig pode passar para União; Lula voltaria a controlar empresa de energia
Avançaram na última semana as negociações entre o ministério da Fazenda e os governos estaduais endividados. As conversas estão sendo mediadas pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), e envolvem a possibilidade de federalização de ativos estaduais. Entre eles estão três empresas mineiras: Cemig (energia), Copasa (água e saneamento) e Codemig (exploração mineral).
Se a federalização da Cemig se concretizar, o governo Lula voltará a ter o controle sobre uma empresa de energia. O presidente Lula assumiu a sua terceira gestão já após a desestatização da Eletrobras e tenta em um acordo de conciliação mediado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) ampliar o seu poder de voto nas decisões da empresa, privatizada em 2022. Paralelo a isso pode, com a proposta de Pacheco, caso aprovada, voltar a ter controle sobre uma empresa de energia.
O avanço das negociações dos estados endividados tornou mais factível o que há poucos meses era visto com ceticismo até pela bancada governista mineira no Congresso: que a Cemig passe de fato a ser controlada pela União, e não mais pelo governo de Minas Gerais. A federalização da Codemig sempre foi considerada mais simples e a da Copasa, assim como da Cemig, é considerada complexa.
Até o final do ano passado, o que estava no cenário era a privatização da Cemig pelo governo de Romeu Zema (Novo). O plano de recuperação fiscal do governador previa a privatização, mas ele não foi aprovado por falta de apoio no legislativo local.
A questão da dívida de Minas foi judicializada após Zema suspender por anos o seu pagamento. Ele precisaria voltar a pagar as parcelas por determinação do STF (Supremo Tribunal Federal) em dezembro do ano passado, mas ganhou mais tempo da Suprema Corte. Naquele momento, Rodrigo Pacheco propôs um plano alternativo prevendo a federalização dos ativos.
Por que a federalização da Cemig se tornou uma possibilidade?
Pessoas próximas ao senador Rodrigo Pacheco e ao governo de Minas dizem que a federalização da Cemig, Copasa e Codemig são, não apenas possibilidades reais, mas fundamentais para resolver a questão da dívida de Minas.
Quais são os pontos a favor?
Politicamente há interesse tanto do governo federal, especialmente pelo Ministério de Minas e Energia, quanto de Pacheco e seu entorno e até por parte do governo de Minas (que preferia a privatização) pela federalização. Os motivos alegados são:
A federalização melhoraria a situação dos servidores, que passariam a ser federais e não estaduais
O governo Lula 3 voltaria a ter uma empresa de energia, já que assumiu após a desestatização da Eletrobras
A situação fiscal de Minas não permite que o estado mantenha esses ativos e pague os salários dos servidores
Por que há dúvidas sobre a viabilidade?
Interlocutores da Fazenda e especialistas de mercado ainda mantêm dúvidas sobre a viabilidade técnica e operacional da federalização de Cemig e Copasa. Do ponto de vista financeiro, não interessa ao Tesouro receber parte da dívida dos entes federados em ativos e ainda ter que assumir mais servidores.
É preciso que se encontre um preço considerado justo de avaliação desses ativos. Já há estimativas, mas nada fechado.
Pela Lei das Sociedade Anônimas, em uma troca de comando, quem assume as ações do acionista majoritário deve oferecer aos acionistas minoritários um valor semelhante ao valor pago ao acionista majoritário. Isso é chamado de tag along. As ações ordinárias da Cemig (CMIG3) têm 80% de tag along, enquanto os papéis preferenciais (CMIG4) não garantem direito de tag along.
Quais são os próximos passos?
Há um acordo entre os governos federal e de Minas para pedir mais 120 dias ao STF para que não seja necessário votar a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal na Assembleia de Minas até 20 de julho (prazo atual determinado pela Suprema Corte).
Enquanto isso, será protocolado no Senado um PLP (Projeto de Lei Complementar) com o acordo que está sendo costurado. O PLP ainda precisa do aval do presidente Lula, o que deve acontecer até o início desta semana.
O que deve trazer o projeto?
O texto deve prever essa possibilidade de entrega de ativos como forma de pagamento e amortização da dívida. Os ativos incluem: recebíveis, créditos judiciais, imóveis, recursos de créditos da previdência, créditos da Lei Kandir e o capital acionário em empresas.
Pelo acordo que está sendo costurado, a União aceita receber ativos como forma de abatimento da dívida, mas o Tesouro recusa a proposta inicial de Pacheco de um prêmio no abatimento no valor do principal no caso da entrega de ativos. O que deve avançar é a possibilidade de desconto do principal no valor dos ativos, sem prêmio, além de uma transição que dê um fôlego financeiro para os estados mais endividados.
Já está mais consolidada a redução dos juros, para que seja possível zerar dos atuais IPCA + 4%, ficando apenas o IPCA, da seguinte forma:
1,5% de desconto no saldo restante ao estado que ceder seus ativos
1,5% em caso dos investimentos em educação, infraestrutura ou segurança
1% para um fundo dos estados que poderá ser usado por estados não devedores e também pelos devedores
O que dizem especialistas em energia?
Para o Instituto Acende Brasil, centro do estudos do setor elétrico, a federalização não será benéfica para os consumidores mineiros.
“A Cemig federalizada em vez de privatizada seria péssimo para os consumidores mineiros, como bem demonstra a história recente. Faz pouco tempo, existiam 7 distribuidoras de energia federalizadas. Nenhuma era capaz de atender integralmente às obrigações regulatórias, incluindo a de ser financeiramente sustentável. O quadro para essas empresas só se reverteu quando, finalmente, foram privatizadas”.